FABIO PUGLIESI
De
Passivos Pagadores de Tributos a Ativos Contribuintes
O ato de pagar impostos, embora sempre
constitua a obrigação de levar bens e dinheiro ao poder político, tem
significados diferentes ao longo do tempo.
Desde o século XVII europeu,
particularmente inglês, vem se discutindo formas de melhor relacionar a
sociedade civil com o Estado, bem como se questiona a necessidade desta
instância a que se atribui o monopólio da violência.
Já
há algum tempo, especialmente depois da disseminação do uso das redes neurais
em que se baseia a “inteligência artificial”, tenho questionado em que medida o
que se viveu influencia o porvir. Afinal os aplicativos, que nos acompanham e
orientam por meio do smartphone, surpreendem ao conhecer desejos antes de se
ter consciência deles e muitas vezes sem uma relação com nossa vivência no
momento em que se os consulta.
Ainda
assim no atual contexto parece que as duas certezas permanecem: a morte e o
pagamento de tributos.
Quanto
à primeira certeza prefiro abstrair comentários. Quanto à segunda está
indissoluvelmente ligada ao homem moderno que paga o Estado para atuar em seu
nome.
Desde
o surgimento do Estado moderno, portanto antes do incremento do debate sobre a
participação política, admite-se a exigência de recursos da sociedade para
manter, pelo menos, a defesa do território. Com o tempo têm surgido as
limitações ao poder de tributar.
Neste
sentido uma estrutura de pessoas administra o cotidiano e se espera que prestem
serviços e representantes fiscalizem a execução destes em última instância.
Esta
estrutura muitas vezes se distancia da experiência do cotidiano e nos faz
esquecer a importância da neutralização dos conflitos que promove.
Neste
sentido penso que cabe rememorar a experiência do pós-guerra mundial.
Um partisan da Resistência Italiana me
garantiu que deixados a si mesmos metade dos homens são assassinos e era capaz
de contar fatos bastante significativos até entre estes.
Embora
caiba aos partisans o mérito de ter garantido, por meio da coordenação do
Comitê de Libertação Nacional, a ordem no Norte e Centro da península desde a
destituição de Mussolini, o fim da ocupação da Alemanha Nazista e antes da
chegada dos aliados, entre os quais os Pracinhas Brasileiros.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada em 1948,
estabelece, no âmbito da Organização das Nações Unidas, os direitos humanos
básicos.
Desde então se experimenta uma reivindicação constante dos
direitos, o que acaba por ser bastante conveniente, uma vez que, ao se admitir
diferenças e novas formas de compartilhamentos de vivências, as possibilidades
das pessoas só tendem a crescer com as infinitas diversidades.
A liberdade é um termo plurívoco, que pode significar “ausência de
limites na ação individual”, conforme as Declarações de Direito do Século XVIII,
assim como livre arbítrio.
No âmbito do Estado parece-me que constitui a combinação ótima combinar
a ausência de limites com o esclarecimento nas deliberações para que a
liberdade da ausência de limites não se perca em um jogo de paixões que acabam por
prejudicar a ação política.
Assim se espera uma maior atenção aos direitos humanos de segunda
geração que impõem prestações positivas do Estado para a redução das
desigualdades por meio de prestações ativas do Estado.
É possível, parece-me, ter comunidades mais inclusivas, mais integradas
no bem comum, igualitárias, cooperativas para se promover o desenvolvimento e o
bem-estar.
Daí se vê o efeito da palavra escrita na Constituição.
Do ponto de vista do Direito geram certo ceticismo tais reivindicações
no texto constitucional, pois, ainda que se admitam rupturas constitucionais,
espera-se consistência ou continuidade das decisões judiciais sob o império da
lei; todavia do ponto de vista político tais assertivas nos textos
constitucionais, ainda que não declarem como e quando devam ser aplicadas,
geram uma expectativa e uma vontade de tais palavras concretizarem pelos
destinatários do poder político.
Todavia a concentração da riqueza acumulada até global na mão de muito
poucos tem sido muito maior do que o crescimento econômico.
Desta forma a riqueza herdada cresce mais que o patrimônio novo,
reduzindo a mobilidade social, inclusive em razão da estagnação populacional no
mundo.
A manutenção da participação democrática no poder depende de uma
distribuição de renda que gere uma nova classe média a exemplo do que ocorreu
após a segunda guerra mundial e a promoção de um bem comum por meio de uma
integração social.
Assim a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico propõe
uma tributação maior sobre as atividades das empresas que atuam na nova
economia da internet e acabaram por mudar as relações do trabalho, tornando
obsoletos conhecimentos técnicos e acarretando exclusão social.
Ocorre que a tributação do
patrimônio e do investimento implica também a possibilidade de haver capacidade
financeira econômica do contribuinte para cumprir a obrigação tributária, bem
como a política econômica necessária para garantir a integração social
contribua para isso.
Assim torna-se indispensável que tal contribuinte, além de pagar,
participe da comunidade. Um ativo contribuinte, ao invés de um passivo pagante
de tributos.
Assim
deve ser superada uma visão que vê a tributação como um jogo de soma zero,
passando a discutir possibilidades para reativar a economia brasileira com a
reforma tributária da PEC n. 110/19, em curso no Senado Federal para
estabelecer no mínimo mais racionalidade na tributação ao eliminar o ICMS, IPI,
ISS, PASEP, CIDE e o salário-educação sem prejudicar a unificação do PIS/COFINS
na Câmara dos Deputados, sempre a respeitar os direitos dos contribuintes. Sem
nos deter no Imposto sobre Bens e Serviços e seu cálculo sobre o preço a
superar o cálculo superposto de tributos, que vem a negam a transparência para
o contribuinte ativo saiba quanto está a
pagar.
Assim
é possível viabilizar o investimento produtivo, uma vez que este se torna
impossível sem regimes especiais que reduzem a segurança jurídica, afastam o
investidor e acabam por gerar regimes diferentes de tributação.
Não
adianta, assim, corrigir a tabela progressiva do imposto de renda das pessoas
físicas sem medidas para reativar o investimento produtivo para a sociedade em
um contexto em que os setores exportadores acabam por causar concentração de
renda ao dispensar trabalhadores na produção.
Disponível em: https://conversandocomoprofessor.com.br/2021/07/04/de-passivos-pagadores-de-tributos-a-ativos-contribuintes/. Acesso em 05-07-21
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