segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

PEC N. 110/19: A AMPLIAÇÃO DA REFORMA TRIBUTÁRIA

 



A Proposta de Emenda à Constituição – PEC n. 110/19 já se encontra em análise na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e, tendo em vista do regimento, deve ir em seguida ao plenário.

A PEC n. 110/19 reproduz o texto final do substitutivo da PEC n. 293/04, aprovado na Comissão Especial de Reforma na Câmara no final da última legislatura, tendo sido relator o então Deputado Luiz Carlos Hauly.

A Comissão Mista da Reforma Tributária resultou de um acordo entre a Câmara e o Senado Federal, para utilizar a PEC n. 45/19, que se limita à matéria de unificação dos tributos sobre o consumo, na PEC n. 110/19.

Assim cabe repassar alguns aspectos da PEC n. 110/19, norteada na simplificação, tecnologia na arrecadação e justiça distributiva para renovar um sistema tributário regressivo e desestimulador do investimento, como indica a perda do papel da indústria na economia.

O tema da industrialização fica revigorado em vista da pandemia da COVID-19, pois os países constataram que ficaram vulneráveis se não desenvolvem uma política industrial. Neste ponto verifica-se que a implantação de IVA nacional em 2017 na Índia tem contribuído para o protagonismo do país na produção de vacinas.

Como na PEC n. 45/19 o Imposto sobre Bens e Serviços deve ser calculado sobre o preço (extinção do chamado “cálculo por dentro”) que impede de saber quanto se paga de imposto no consumo, produto da arrecadação fica para o local em que mora o consumidor (extinção da “guerra fiscal” entre Estados e Municípios para atrair investimento por meio de “incentivos fiscais” de constitucionalidade questionável) e extinção de tributos sobre o consumo. Neste ponto a Comissão Mista deve escolher entre a mais ampla da PEC n. 110/49 e a mais limitada da PEC N. 45/19, este debate será relevante para se aceitar ou não por um período “tampão” a CPMF que poderá ser mandada pelo Poder Executivo para financiar o auxílio emergencial.

-A PEC N. 110/19 prevê um modelo de cobrança eletrônica (modelo Abuhab) em que o IBS passa a ser devido no momento do pagamento, ao invés do faturamento, bem como um sistema automático que vai deduzir o crédito do IBS em tempo real e recolher automaticamente, vinculado ao sistema bancário e a empresa pode controlar tudo na hora.

-A PEC N. 110/19 estabelece que as alíquotas devem ser padronizadas nacionalmente, mas cria a possibilidade de haver alíquotas reduzidas ou zeradas para itens como remédios, alimentação, transporte urbano, saneamento básico, educação.

-A PEC N. 110/19 estabelece a competência da União para criar um imposto seletivo unifásico para desestimular o consumo de bebidas e para proteção do meio ambiente. O estímulo para o investimento pode se verificar a devolução do imposto incidente sobre o bem de ativo fixo de imediato.

-A PEC N. 110/19 prevê um mecanismo, por meio da nota fiscal eletrônica Brasil, em que se pode desonerar de imediato os beneficiários dos programas de transferência de renda como bolsa família.
O produto da arrecadação do imposto sobre a transmissão “causa mortis” e doação passa a ser dos Municípios.

Estes são alguns aspectos da PEC n. 110/19 que indicam uma papel mais amplo do que PEC n. 45/15 que se limita a unificar os impostos sobre o consumo, além de suas disposições poderem ser compatíveis com a PEC n. 110, se assim estabelecer o relatório da Comissão Mista da Reforma Tributária.



Publicado originalmente em: 

http://www.ambientelegal.com.br/pec-n-11019-a-ampliacao-da-reforma-tributaria/ . Acesso em: 15-fev-2021

A Indústria e a Unificação dos Tributos sobre o Consumo

 A Indústria e a Unificação dos Tributos sobre o Consumo

         Neste artigo destacar-se-á a relevância do tema da unificação dos tributos sobre o consumo para a industrialização.

         Embora o Brasil tenha abandonado uma política industrial baseada no desenvolvimento tecnológico, o processo de substituição de importações garante modernização nas relações sociais e emprego.

         A transferência das atividades industriais da Ford para o Uruguai e Argentina tem um caráter simbólico, pois o Mercosul dispõe de um regime automotivo e se verifica a isenção dos impostos sobre a importação entre o Brasil e estes países.

         Ocorre que a Ford foi pioneira na fabricação em massa de bens de consumo, produzia todas as peças dos veículos que produzia, exceto os pneus, e vinha fabricando seus veículos no Brasil desde 1919.

         O fundador da Ford, Henry Ford, aplicou métodos de administração inovadores.

A desindustrialização no Brasil tem sido acelerada nos últimos anos. Estima-se o fechamento de uma dezena de fábricas diariamente nos últimos cinco anos.

As diferentes políticas sanitárias durante a pandemia da COVID-19 têm determinado que os países a fixação de barreiras não  tarifárias.

Assim a autonomia do país envolve produção interna por meio de sua indústria, a exemplo do que aconteceu na primeira e na segunda guerra mundiais.

Os argumentos contrários ao exposto entendem que tais empresas industriais tiveram “incentivos fiscais” suficientes, mas justamente aí se encontra a vulnerabilidade do argumento.

Ocorre que tais “incentivos fiscais” consistentes na isenção e redução de tributos sujeitam-se a requisitos que conformam sua conduta futura e se sujeitam ao controle da Administração Tributária.

Caso se considere que qualquer requisito não tenha sido observado, deve a autoridade tributária exigir o tributo acrescido de multas e juros de mora.

Enfim se a indústria necessita de “incentivos fiscais”, a tributação sobre o consumo é ruim e desestimula o investimento que aumenta a produtividade.

Neste sentido, cabe razão a Cleide Regina Furlani Pompermaier ao criticar que não se deve chamar de “reforma tributária” a uma “unificação dos tributos sobre o consumo”. De fato, o ideal seria ao menos uma tributação sobre o patrimônio renovada segundo a PEC n.110/19.

A OCDE constitui um foro composto por 35 países, dedicado à fixação de padrões em vários temas (“soft law”). Suas reuniões e debates, particularmente sobre atividade econômica e investimento internacional, permitem troca de experiências e coordenação de políticas em áreas diversas da atuação governamental. O ingresso do Brasil na OCDE permite que possamos influenciar estes padrões entre os países mais desenvolvidos.

A OCDE condiciona a entrada do Brasil à eliminação dos cinco tributos diferentes (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS) e seus diferentes regimes que inviabilizam a concretização do direito constitucional do contribuinte: “A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços”. Além do disposto no artigo 6., inciso III do CDC que estabelece a informação sobre tributos incidentes no consumo.

Ocorre que estas disposições se tornam difíceis de serem concretizadas diante da complexa incidência de diferentes tributos sobre a mesma base e os cálculos “por dentro” do ICMS que dificultam ao consumidor o entendimento do valor que arca e os diferentes regimes jurídicos

Neste sentido as propostas do imposto sobre bens e serviços - IBS, constantes nas Propostas de Emenda à Constituição ns. 110/19 e 45/19 viabilizam que o produto da arrecadação permaneça no domicílio do consumidor e o cálculo do IBS deva ser sobre o preço como se verifica nos países que adotam o IVA.

A cobrança no destino ao invés da origem torna sem sentido a persistente “guerra fiscal” entre Estados e Municípios para atrair investimento para o seu território.

A OCDE considera que o sistema tributário fragmentado do Brasil dá origem a um dos custos fiscais mais elevados do mundo. Uma ampla gama de isenções e regimes especiais reduzem a justiça e o efeito de redistribuição de impostos. Assim o investimento em infraestrutura está aquém do necessário há anos, tornando a logística também desafiadora e cara.

No relatório da OCDE sobre o Brasil aconselha que se siga o exemplo da India (Estado federativo, a exemplo do Brasil) que implementou, em 2017, um imposto sobre valor agregado nacional, chamado Imposto sobre Mercadorias e Serviços (GST). O GST substituiu cerca de trinta impostos diferentes anteriormente cobrados separadamente pelos governos central, estadual e local.

As alíquotas do GST foram harmonizadas em toda Índia e foram criados incentivos para formalização e conformidade, pois os compradores de insumos intermediários têm interesse que essas entradas observem a legislação, o que poderia ser uma ideia para superar os modelos do Simples Nacional que acabam por estimular que a empresa permaneça de pequeno porte.

A OCDE destaca que um consenso entre os entes federativos foi difícil. O sucesso desta unificação levou a um crescimento da economia como um todo dissolvendo eventuais perdas setoriais.

Alcançar o consenso entre os estados foi politicamente difícil na India, a exemplo do Brasil de hoje, mas as preocupações sobre quebras de receita foram tratadas por uma central de garantia do governo de que as receitas do estado cresceriam 14% ao ano em 5 anos.

Estabeleceu-se uma compensação por meio de um fundo  criado para compensar os estados por receitas mais baixas.

A governança do imposto na Índia foi delegada a um Conselho de Secretários da Fazenda, semelhante ao Conselho de Política Fazendária (CONFAZ).

 As decisões do conselho exigem uma maioria de 75%, não unanimidade, embora experiência tenha demonstrado que se acabe adotando uma postura colaborativa e todas as decisões estejam sendo tomadas por unanimidade, dado o sucesso no crescimento da economia com a unificação dos impostos sobre o consumo.

Um recurso atraente do GST para reduzir a evasão fiscal foi uma coordenação de documentos fiscais por meio da aplicação de técnicas de dados para identificar lacunas de conformidade, que estariam fora do alcance da maioria dos entes federativos.

A pandemia da COVID-19 demonstra uma aceleração de processos de mudança que podem isolar o Brasil até no continente, considerando que México, Chile e, no ano de 2020, a Colômbia já ingressaram na OCDE.

Publicado originalmente em:

http://conversandocomoprofessor.com.br/2021/02/11/a-industria-e-a-unificacao-dos-tributos-sobre-o-consumo/. Acesso em: 15-fev-2021


terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Desenvolvimento Econômico Local e Gestão Municipal

 


Guido Asencio

Os municípios em sua lógica de serem os governos locais enfrentam constantemente o desafio de identificar ações estratégicas, que lhes permitam resolver diversas complexidades, a curto, médio e longo prazo, caracterizadas por cenários altamente dinâmicos, influenciados por mudanças, em diferentes áreas, como políticos, sociais, territoriais, administrativos, etc., que se inserem, sem dúvida, na natureza institucional de um Município.

Passar pelas diferentes ações que são realizadas na gestão municipal, envolve a realização de planejamento visando assumir processos de mudança que tenham que adotar aspectos modernizadores, com senso de originalidade, coletando particularidades apresentadas emr cada território, evitando, sempre que possível, gerar traços de outras realidades, sem perder de vista, a importância das tendências regionais, nacionais ou globais , que pode servir de espelho para a geração de boas práticas, que fortalecem o governo local.

Enquanto isso, para ampliar a visão de aprimoramento de um sistema municipal com melhores armas para enfrentar essa complexidade, é essencial estabelecer uma gestão baseada na adequada coordenação das redes, capaz de gerar processos de inclusão, envolvendo atores relevantes, como representantes de instituições, empresas ou organizações básicas, que tenham impacto direto ou indireto na construção e modelagem do território , buscando uma visão clara e projetiva em conjunto, do que deve ser alcançado, do ponto de vista econômico-produtivo e social, com isso, é possível moldar um capital social, equipado com ferramentas de viabilização de diferentes pontos de vista.

Para melhorar os modelos de gestão municipal, é essencial levar em conta os avanços na descentralização que está sendo feito no Chile, que se inserem no desafio de levar a sério a reavaliação dos processos de gestão regional, para isso, é essencial explicar e tornar transparente os níveis de eficiência, em termos de distribuição de recursos, para a facilitação do acesso aos serviços públicos básicos à geração de políticas públicas, tão fundamentais quanto, melhoram a conectividade, tanto nas áreas urbana quanto rural, entre outras ideias que podem servir como contribuições significativas que ajudam a fazer a diferença entre um ou outro município.

Para alcançar o desenvolvimento local harmonioso e equilibrado entre os municípios, é preciso fazer um trabalho decisivo para reduzir as grandes lacunas entre os municípios de grande e pequeno porte. Os municípios mais vulneráveis têm a desvantagem de ter recursos financeiros limitados, o que significa que eles têm menos possibilidades de desenvolvimento em todas as suas áreas. Um exemplo disso é o acesso limitado a uma estrutura qualificada de recursos humanos, resultando em diversos efeitos colaterais, dentro dos quais menos ferramentas podem ser imaginadas para facilitar as possibilidades de negociação de projetos de investimento, por isso redes virtuosas de troca de experiências devem ser geradas, visando a obtenção de entropia positiva, com isso, é possível acessar o estabelecimento de trocas em termos de acesso à informação e conhecimento entre os municípios, a isso é preciso acrescentar a criação de parcerias público-privadas, que gerem efeitos sinérgicos beneficiando todo o ambiente socioeconômico de um determinado território.

A dinâmica territorial está constantemente repleta de problemas emergentes, decorrentes de uma série de demandas cidadãs, que influenciam a gestão e o financiamento de múltiplos requisitos, que se devem a funções originárias de diferentes ações executadas por meio do processo decisório, levando em conta a implementação de políticas públicas, que tenham relação direta com a gestão municipal e que , muitas vezes, são inevitáveis quando se trata de realizá-los em um governo local.

Tais decisões exigem a implementação de planos de contingência, levando em conta as limitações de estrutura, política e organizacional. Nessa encruzilhada, é essencial estabelecer mecanismos de interação direta com outros órgãos públicos, em seus níveis provinciais, regionais e setoriais, garantindo que respondam com respeito e efetividade às constantes demandas feitas pelos cidadãos.

Os municípios, órgãos dotados de autonomia, devem ser capazes de adaptar as políticas gerais dos governos, considerando as realidades de cada território, adutor de competências locais que, se valorizadas e influenciadas por sua própria liderança, tornam-se protagonistas do progresso de suas localidades e não meros executores de políticas nacionais.

Por outro lado, sabe-se que as capacidades financeiras dos municípios, em relação à sua ampla gama de competências, aliadas às demandas exigidas pelos cidadãos, são limitadas. De acordo com dados da Subdere (2007), os municípios chilenos possuem 13% dos recursos do governo central, com os quais devem financiar obras locais, prestar serviços de limpeza e ornamentação, iluminação pública, manutenção de parques e jardins, planejar e ordenar o território, administrar educação básica e média, saúde básica, fomentar a cultura, cuidar do meio ambiente, promover e estimular o desenvolvimento econômico local e fornecer os recursos humanos necessários para manter as plantas dos funcionários municipais , entre outras funções derivadas de seu papel como proximidade com os cidadãos.

As capacidades organizacionais dos Municípios também devem ser equipadas de ferramentas, atuando como órgãos de canalização e facilitadores do empreendedorismo local, destacando as características endógenas que os territórios possuem,  agregando um componente de identidade a cada projeto público e/ou privado que é realizado,  bem como articulando com os demais planos de serviços públicos que possuem em objetivos comuns devem fazer contribuições reais e concretas de suas diferentes esferas.

Em suma, o desafio que os municípios têm de propor para enfrentar os desafios do desenvolvimento social e econômico local, é dado pelo estabelecimento de mecanismos de gestão de alta complexidade, onde a articulação de todos os atores envolvidos, o que pode ser uma contribuição, de cada setor representando os mundos público e privado, é relevante, ou seja, há a necessidade de abrir o espectro de responsabilidades para um melhor progresso, dando importância ao efeito sinérgico que a interação entre diferentes organizações chamadas para construir um melhor desenvolvimento social e econômico pode ter.