terça-feira, 24 de julho de 2012

Improbidade administrativa (Judiciário e os Pequenos Municípios)


Um exemplo de atuação do Judiciário para os pequenos Municípios, a comparação com se procede em relação às autoridades da União é inevitável.

Prof. Dr. Fabio Pugliesi

Número do Processo : 1.0183.06.104707-6/001

Relator : EDUARDO ANDRADE

Data do Julgamento : 25/11/08

Data da Publicação : 09/01/09

Inteiro Teor :

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE VALORES AO

ERÁRIO -COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AOS COFRES MUNICIPAIS, QUANTO À

IRREGULARIDADES APONTADAS NA EXORDIAL - RECURSO PARCIALMENTE

PROVIDO, PARA AFASTAR AS SANÇÕES ALCANÇADAS PELA PRESCRIÇÃO.-

Havendo provas de malversação do dinheiro público, com despesas

irregulares, bem como de comportamento negligente na gestão do

erário, em relação às irregularidades apontadas na exordial, deve

o requerido ser condenado ao ressarcimento ao erário, pelos

respectivos atos impugnados pelo Ministério Público.- Recurso

parcialmente provido, excluindo-se da sentença sanções imputadas

ao réu, atingidas pela prescrição.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0183.06.104707-6/001 - COMARCA DE CONSELHEIRO

LAFAIETE - APELANTE(S): GERALDO LUCIO DE CARVALHO - APELADO(A)(S):

MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES.

EDUARDO ANDRADE

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de

Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório

de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas

taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR

E DAR PROVIMENTO PARCIAL.

Belo Horizonte, 25 de novembro de 2008.

DES. EDUARDO ANDRADE - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. EDUARDO ANDRADE:

VOTO

Trata-se de apelação interposta contra a sentença de f. 165-174,

proferida nos autos da 'Ação Civil Pública de Ressarcimento aos

Cofres Públicos por Ato de Improbidade Administrativa' ajuizada

pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face de

Geraldo Lúcio de Carvalho, ex-Prefeito do Município de

Itaverava/MG.

O douto Juiz a quo julgou procedente o pedido inicial, para

condenar o réu a restituir ao erário do Município de Itaverava a

importância de R$15.827,70, devidamente atualizada e corrigida

segundo os índices da Corregedoria Geral de Justiça, a partir de

novembro de 2003, com juros de mora de 1% ao mês, a partir da

citação.

O i. Sentenciante também aplicou as seguintes penalidades ao

suplicado: perda dos direitos políticos do réu, por 10 anos;

pagamento de multa civil, equivalente a três vezes o valor do dano

causado ao erário; proibição do requerido de contratar com o Poder

Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou créditos,

direta ou indiretamente, pelo prazo de 10 anos; indisponibilidade

de bens em seu nome, no intuito de assegurar eventual

ressarcimento.

Foram aviados embargos declaratórios, às f. 179-180, sendo os

mesmos rejeitados às f. 185-186.

Geraldo Lúcio de Carvalho interpôs recurso de apelação, às f. 188-

199, sustentando, em síntese, que: recebeu do Ministério da

Educação verba subvencionada para a garantia das escolas públicas

do ensino fundamental da cidade de Itaverava, através do convênio

43689/98, tendo procedido com as formalidades legais para a

contratação, com empresa privada, da aquisição de carteiras

escolares; o pagamento da importância de R$6.700,00 foi

efetivamente realizado, e o objeto do contrato cumprido, conforme

declaração emitida pela Diretora da Escola Estadual Conselheiro

Antão; a baixa da empresa 'Comercial GSS Ltda.-ME' ocorreu em data

anterior à entrega das carteiras escolares, não constando dos

autos que tal baixa se deu antes da contratação com o poder

público; não há, nos autos, prova da ocorrência do ato de

improbidade; não há provas de prejuízo para a municipalidade, e

sua omissão não se encontra revestida de má-fé ou corrupção; a

dosagem nas sanções foi inadequada.

Contra-razões apresentadas pelo Ministério Público, às f. 204-214,

pugnando pelo provimento parcial do recurso, em razão de

julgamento ultra petita.

Remetidos os autos à d. Procuradoria-Geral de Justiça, o ilustre

representante do Ministério Público, Dr. Geraldo de Faria Martins

da Costa, apresentou parecer às f. 221-224, opinando pela

reiteração dos argumentos postas nas contra-razões do presente

recurso.

Geraldo Lúcio de Carvalho manifestou-se, às f. 226-227, alegando

litispendência, tendo o Ministério Público repudiado tal alegação,

às f. 246-271.

Vieram-me novamente conclusos os autos.

Conheço do recurso, porque se encontram presentes os seus

pressupostos de admissibilidade.

PRELIMINAR - LITISPENDÊNCIA

Alegou o ora apelante, às f. 226-227, que o fato discutido nos

presentes autos já foi analisado no feito de nº 1.0183.05.084310-

5/001.

A meu juízo, data venia, não se há falar em litispendência.

Conforme iniciais juntadas aos autos pelo i. representante do

Ministério Público, às f. 246-271, vê-se que a exordial da

presente Ação Civil Pública cinge-se ao Convênio de nº 43.689/98,

firmado entre o ex-Prefeito do Município de Itavera e o Ministério

da Educação, não sendo a verba referente a esse convênio alvo de

restituição, nos autos da Ação Civil Pública de nº 0183.05.084310-

5.

Dessa forma, não se há falar em litispendência, pelo que REJEITO A

PRELIMINAR.

MÉRITO

No caso dos autos, o Ministério Público ajuizou a presente ação

civil pública, alegando a prática de atos de improbidade

administrativa por parte do ex-Prefeito do Município de Itaverava.

A meu juízo, rogata venia, não obstante o inconformismo do réu,

ora apelante, o conjunto das provas dos autos demonstra a

ocorrência de prejuízo direto ao erário, consubstanciado em

irregularidade administrativa apontada pelo Ministério Público

que, ao menos, pode ser imputadas à conduta omissiva do ex-

Prefeito, ora apelante, dando causa à responsabilidade pelo seu

ressarcimento, de forma a recompor o patrimônio público.

Especificamente, os documentos dos autos apontam irregularidade de

despesa pública, sem a devida comprovação de sua destinação

regular, não tendo o réu, ora apelante, desconstituído, de forma

satisfatória, aqueles apontamentos lastreados em vasta

documentação aportada nos autos.

Vejamos:

a) aos termos do Ofício de nº 21/03, de f. 14, o então Prefeito do

Município de Itaverava informou não possuir conhecimento acerca da

realização, pela administração pretérita, assumida pelo ora

apelante, do convênio de nº 43.689/98, já que não foi encontrado

registro de documentações a ele referentes no arquivo municipal;

b) conforme análise da Nota de Empenho Ordinário de nº 02212, de

f. 63, não há assinatura do beneficiário nem nota fiscal a

acompanhando. Ressalto, nesse ínterim, que cabe ao Prefeito do

Município manter os arquivos públicos em ordem;

c) não houve prestação de contas do convênio em pauta ao FNDE;

d) em juízo, inquirida como testemunha do Ministério Público, a

Diretora da Escola Estadual Conselheiro Adão, Srª. Ângela Maria

Gonçalves de Carvalho, informou, às f. 145-146:

"... que no início de fevereiro do ano de 1999 (...) teria

assumido a direção da escola (...), estando ocupando desde esta

época tal cargo; que (...) se recorda de ter solicitado ao

requerido, então Prefeito (...), algumas carteiras para a escola,

tendo sido atendida a sua solicitação; que (...) não se recorda de

tudo, sabendo apenas que o nome da empresa fornecedora das

carteiras seria representada por algumas siglas, iniciando com a

letra G..

(...) que (...) ocupava o cargo de Diretora da escola quando as

mencionadas carteiras lhes foram entregues; que (...), ao receber

as carteiras, não fez nenhuma verificação a nível de documentação

para comprovar se tais bens teriam sido adquiridos através do

convênio de nº 43.689/98 (...); que as carteiras foram entregues

na escola após a depoente estar ocupando o cargo de Diretora e não

sabe informar se tais carteiras teriam sido entregues em novembro

de 1998; que (...) não recebeu nenhuma nota fiscal junto com as

carteiras e nem tampouco firmou qualquer recibo relativo ao

recebimento das carteiras" (sic).

Vê-se, portanto, não obstante as demais irregularidades apontadas

pelo i. representante ministerial, como ausência de procedimento

licitatório ou de inexigibilidade de licitação a justificar a

compra das carteiras escolares para o Município de Itaperava, e

mesmo diante da alegação do apelante de que contratou com empresa

regularmente constituída, que não há elementos suficientes, prova

inequívoca, a agasalhar os argumentos do apelante, no sentido de

que as carteiras adquiridas com verba oriunda do convênio de nº

43.689/98 foram devidamente entregues à escola.

Conclui-se: a despesa pública acima analisada não foi comprovada

através de recibos ou de outros documentos hábeis a demonstrar a

prestação do serviço contratado, havendo, por conclusão lógica,

malversação do dinheiro público, em flagrante comportamento

negligente do apelante na gestão do Executivo. Em síntese, restam

ausentes as provas da relação do interesse público com os

apontamentos das despesas e gastos, ou correção daquelas despesas

ou do cumprimento do dever funcional.

Não há dúvida que, sendo o apelante o Chefe do Poder Executivo, a

repercussão da sua conduta contribui em maior grau para o

descrédito da Administração Pública, frustrando a própria

credibilidade dirigida pelo povo, através do voto popular.

Tem-se a restituição pleiteada na exordial como imposição lógica

pelas infrações cometidas.

Cabe aqui a lição de WALLACE PAIVA MARTINS JÚNIOR:

"A Constituição de 1988 teve o mérito de inserir em seu texto uma

série de princípios e valores que, embora anteriormente

mencionados pela doutrina, ganharam a força de princípios

constitucionais norteadores das funções do Estado. Hoje, a exemplo

do que ocorre em outros sistemas jurídicos, é possível falar em

uma legalidade estrita, para fazer referência à exigência de lei

em sentido formal para a prática de determinados atos, e em

legalidade em sentido amplo, para abranger não só a lei, mas

também todos os valores e princípios que decorrem implícita ou

explicitamente da Constituição.

Dentre esses princípios está o da moralidade, a significar que a

atuação dos agentes públicos deve confrontar-se não apenas à lei

em sentido formal, mas também a determinados valores que se

colocam acima do direito positivo, como a idéia de honestidade,

boa-fé, lealdade, decoro, ética, no exercício da função pública."

(in Probidade administrativa. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, p. XIII)

Dessa forma, outra não poderia ser a conclusão do i. Juiz a quo,

senão pela condenação do apelante na restituição da importância de

R$15.827,70, razão pela qual a mantenho.

Por fim, vejo que não se há falar em sentença ultra petita, visto

que as sanções previstas no Art. 12, da Lei nº 8.429/92, decorrem

de conseqüência lógica do ato de improbidade administrativa.

Entretanto, ressalto a questão da prescrição no caso em tela.

O artigo 23, incisos I e II, da Lei 8.429/92, disciplinou a

prescrição por ato de improbidade, ocorrendo, pois, em cinco anos

após o término do exercício do mandato, de cargo em comissão ou de

função de confiança e, para os que exercem cargo ou emprego

efetivo, no mesmo prazo em que lei específica atribui para a

punição a faltas disciplinares.

Já o Art. 37, §5º, da Constituição da República, dispõe sobre a

imprescritibilidade das ações para ressarcimento de danos, in

verbis:

"Art. 37

(...) § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para

ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que

causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de

ressarcimento."

Resta claro, pois, que a prescrição estabelecida por lei só

ocorrerá nos casos das sanções disciplinares (primeira parte do

§5º, do Art. 37, da CF/88), e não para o ressarcimento dos danos

causados (segunda parte do aludido texto legal).

Celso Antônio Bandeira de Mello diz:

"Em caso de atos de improbidade administrativa, sem prejuízo da

ação penal cabível, o servidor ficará sujeito à suspensão dos

direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos

bens e ressarcimento do erário, na forma e gradação previstas em

lei (art. 37, § 4º), sendo imprescritível a ação de ressarcimento

por ilícitos praticados por qualquer agente que cause prejuízo ao

erário (art. 37, § 5º)."(Curso de Direito Administrativo, 13ª ed.,

p.263).

Da lição de Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, in

'Improbidade Administrativa' (Lumen Iuris, 2002. p. 420):

"... é voz corrente que o art. 37, §5º, da Constituição dispõe

sobre o caráter imprescritível das pretensões a serem ajuizadas em

face de qualquer agente, servidor ou não, visando o ressarcimento

dos prejuízos causados ao erário. Como conseqüência, tem-seque,

somente as demais sanções previstas nos feixes do art. 12 da Lei

de Improbidade serão atingidas pela prescrição, não o

ressarcimento do dano (material ou moral), o qual poderá ser a

qualquer tempo perseguido. Por este motivo, nada impede que seja

utilizada a ação referida no art.17 da Lei nº 8.429/92, ou

qualquer outra dotada de eficácia similar, com o fim, único e

exclusivo, de demonstrar a prática do ato de improbidade e

perseguir a reparação do dano."

Já do escólio da ilustre Professora MARIA SYLVIA ZANELLA DI

PIETRO, tem-se que "são, contudo, imprescritíveis, as ações de

ressarcimento por danos causados por agente público, seja ele

servidor público ou não, conforme o estabelece o artigo 37, § 5º,

da Constituição." ("Direito Administrativo", 14ª edição, São

Paulo, Atlas, 2002, p. 695).

O pedido inicial tem caráter condenatório. A ação civil pública

identifica e indica efetivo prejuízo a ser ressarcido ao erário.

Portanto, inquestionável que o artigo 37, § 5º, da Constituição

Federal, que estabelece a imprescritibilidade das ações de

ressarcimento, repele a incidência da prescrição qüinqüenal quanto

ao ressarcimento, restando, pois, quando às sanções

administrativas, a prescrição qüinqüenal, que in casu, configurouse,

como bem reconheceu o ilustre representante do Ministério

Público, em suas contra-razões recursais, visto que o feito foi

ajuizado somente em 2006, tendo ocorrido o término do mandato do

apelante em 2000.

Esse foi o meu entendimento, quando do julgamento do Agravo de

Instrumento de nº 1.0672.04.148760-0.001, do qual fui Relator. Na

mesma esteira, esta 1ª Câmara Cível assim se posicionou:

"EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - RESPONSABILIZAÇÃO DE AGENTE PÚBLICO

POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - DEVER DE RESSARCIR -

IMPRESCRITIBILIDADE - SANÇÕES ADMINISTRATIVAS - PRESCRIÇÃO

QÜINQÜENAL - CONSTRIÇÃO DE BENS - POSSIBILIDADE. Responde pelo

prejuízo causado ao erário público o agente público que de

qualquer forma concorreu para o dano. A Comissão de licitação é

solidariamente responsável pelos atos irregulares que causem

prejuízo ao erário. As sanções se submetem à prescrição qüinqüenal

prevista no artigo 23, I, da lei 8.429/92. A pretensão de

ressarcimento é imprescritível. As questões cautelares devem ser

deferidas pelo julgador desde que possa extrair dos autos dois

pressupostos básicos: o perigo de dano na demora da prestação

jurisdicional, e a evidência de que exista o direito que assista à

parte requerente. A indisponibilidade de bens não é sanção, mas

meio de assegurar o resultado útil do processo." (APELAÇÃO CÍVEL

N° 1.0309.04.002338-9/001 - COMARCA DE INHAPIM - APELANTE(S): JAIR

VIEIRA CAMPOS E OUTRO(A)(S) PREFEITO MUN DOM CAVATI - APELADO(A)

(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATORA: EXMª. SRª.

DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE). Julg. 13/02/07. Publ.

13/03/07).

Com tais considerações, nesses termos, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO

RECURSO, para excluir da condenação imposta ao ora apelante as

sanções fixadas nos itens A.1, A.2 e A.3, constantes da parte

dispositiva da sentença, às f. 173-174, mantendo a condenação

referente ao ressarcimento de R$15.827,70 aos cofres municipais.

Custas recursais ex lege.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es):

GERALDO AUGUSTO e VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE.

SÚMULA : REJEITARAM A PRELIMINAR E DERAM PROVIMENTO PARCIAL.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0183.06.104707-6/001

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