quinta-feira, 7 de novembro de 2019

A Necessidade e a Viabilidade do Imposto sobre Bens e Serviços

Faz-se necessária superação na economia digital da dicotomia ICMS e ISS, o IBS vai resultar dos debates das Propostas de Emenda à Constituição – PEC N. 45 e 110 (esta baseada na PEC n. 293/04 aprovada na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, tendo sido relator o deputado Luiz Carlos Hauly) em curso na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Abstrai-se neste artigo a análise da PEC n. 126/19, mas se destaca nela a continuidade do Simples Nacional: expressão do princípio da ordem econômica que determina “tratamento diferenciado às empresas de pequeno porte”.

No recurso extraordinário n.176626 o Supremo Tribunal Federal decidiu que, em razão de não ter por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, nas operações de “licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador” não podem os Estados instituir ICMS. Dessa impossibilidade, no entanto, não resultou a impossibilidade de incidir o ICMS na circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo – o chamado “software de prateleira” – os quais constituem mercadorias postas no comércio.

Entretanto os softwares passaram a ser baixados da internet e desapareceu a venda de softwares em caixas, instalados nos antigos disquetes ou cd.

Em vista disto, na venda de software, o convênio ICMS n. 106/2017 estabelece a definição de “bens e mercadorias digitais” para fins tributação pelo ICMS.

Todavia esta definição, para fins de aplicação do convênio, desconsidera não poder a norma tributária alterar o alcance dos conceitos de direito privado, quando se trata de delimitar competências tributárias, conforme estabelecido no artigo 110 do Código Tributário Nacional com suporte na Constituição Federal, que atribui à lei complementar dispor sobre a solução de conflitos de competências tributárias dos entes federativos.

Assim, se o STF em recurso extradordinário, que a rigor só alcança o contribuinte a que se refere, reconheceu a incidência do ICMS deve-se ao fato de, na época, ser o software ser vendido em caixas, o que desapareceu.

Daí se verifica uma tendência do software ser tributado pelo ISS, em vista do pleiteado na ADI n. 5958.

Observe-se que a ADI n. 5958 também defende que, no caso do software, inexiste a “circulação” do produto ou a transferência de propriedade, essenciais para se aplicar a hipótese de incidência relativa ao ICMS. De fato ocorre, porém, a cessão de direito de uso, pois o comprador da licença não se torna proprietário do programa, mas apenas tem assegurado o direito de utilizá-lo por determinado tempo.

Além do mais surgem situações em que não incide nem o ISS ou o ICMS, em razão da disfunção sistêmica da tributação brasileira. Evidente se tratar de notória injustiça tributária.

Neste sentido a súmula vinculante n. 31 fixa ser “inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.

Desta forma a locação de automóveis, disseminada em razão da prestação de serviços por aplicativos de transporte, não está sujeita ao ISS ou ao ICMS por não se tratar de uma operação de circulação de mercadoria.

Além de tudo a internet tem se caracterizado por crescente mobilidade e onipresença ao usar sensores (de voz, inclusive, cada vez mais baratos e poderosos, afinal quem não se surpreendeu com as manifestações surpreendentes da assistente digital participando de nossas conversas?) além da aplicação da  inteligência artificial nos softwares que se aperfeiçoam com o uso.

A revista Nature publicou artigo em que divulga já ter a Google desenvolvido a internet quântica que amplia o sistema binário (0 ou 1) atualmente usado para frações entre 0 e 1.

Isto permite sistemas mais sofisticados com menor uso de memória. Assim um cálculo que levaria dez mil anos no sistema utilizado na internet atual ser feito em três minutos e vinte segundos.

Ainda que este Admirável Mundo Novo chegue ao STF e permita vislumbrar outras possibilidades para viver, continua a arrecadação dos Estados federados a depender das operações com combustíveis e energia elétrica, bem como alimentos, remédios e outras mercadorias.

Relativamente aos municípios verifica-se uma grande assimetria, sendo que os cem maiores municípios têm realidades bem diferentes das demais.

Como já temos referido nos artigos precedentes, as PEC n. 45/19 e 110/19 têm aspectos iguais, compatíveis ou incompatíveis.

Ambas as PEC consagram o cálculo do IBS sobre o preço, superando o critério de cálculo em que o imposto integra sua base, o que na prática aumenta indiretamente a tributação; efetuam a tributação no destino; bem como permitem o crédito de todos os insumos.

As PEC divergem, todavia, quanto ao critério de fixação de alíquotas. A PEC n. 110/19 as padroniza nacionalmente; por sua vez a PEC n. 45/19 em se fixa uma alíquota nacional e os demais três entes federativos podem acrescentar uma alíquota de 3% acima da alíquota padrão.

As PEC divergem também quanto ao protagonismo dos entes federativos no controle do sistema. A PEC n. 110/19 atribui um papel maior aos Estados Federados e Municípios e a PEC n. 45/19 à União.

O período de transição da PEC n. 110/19 é de cinco anos e da PEC n. 45/19 é de dez anos. Parece-me que nos setores ligados ao softwares, em vista do descrito acima,  admitir-se-ia até uma transição imediata.

Neste sentido afigura-se interessante a proposta do professor Alberto Macedo, apresentada no II Congresso de Administração Tributária em Florianópolis, em que propõe que o IBS pode ser implantado “por dentro” mediante alterações no ICMS e no ISS.

Por hora, destaca-se, o ICMS totalmente no destino, que poderia ser realizado com uma EC que altere o inciso VII do parágrafo segundo do artigo 155, já alterado gradativamente pelo EC n. 87/15.

Relativamente ao ISS dar-se-ia a fixação de uma alíquota única que permitiria a extinção da lista de serviços, assim os Municípios poderiam tributar todos os serviços, exceto os tributados pelo ICMS. Bastaria uma EC excluir no inciso III do artigo 156 a expressão “definidos em lei complementar” e revogar a expressão “alíquotas máximas e mínimas”.