Já que a possibilidade de alterar foge ao alcance de cada empresa, como organizá-la?
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Prof. Dr. Fabio Pugliesi
Folha de São Paulo - 27 de agosto de 2012
As constantes mudanças e a
disparidade nas regras entre os Estados fazem do ICMS (Imposto sobre a
Circulação de Mercadorias e Serviços) uma dor de cabeça para os empresários.
Em cada unidade da Federação o imposto tem especificidades nas
alíquotas, nos prazos e nos procedimentos burocráticos.
A simplificação
seria um dos maiores objetivos de uma reforma tributária, mas a resistência dos
Estados, dado o peso do ICMS na arrecadação (representa mais de 80% da receita),
é um entrave.
Foram 20 modificações diárias em média neste mês em todo o
país, segundo levantamento de Rita Andrade, coordenadora editorial da IOB
Folhamatic, que desenvolve softwares de contabilidade.
Podem surgir 60
normas em um dia, diz Flavia Martin, consultora da Fiscosoft, empresa que
fornece informações e cursos de tributação.
Entre as mudanças do dia 23,
por exemplo, estavam a redução da alíquota cobrada para suco de laranja em São
Paulo e a mudança da base de cálculo do imposto na venda de materiais de
construção no Rio Grande do Sul.
Além disso, ao menos sete Estados
editaram decretos neste mês para reverter arrecadação do imposto com a venda de
Big Mac do dia 24, quando houve campanha em prol de instituições de combate ao
câncer infantil.
"Uma mudança provocada por uma alteração dessas pode
afetar todo um planejamento", diz Tales Giaretta, diretor da Toyo Setal, empresa
do setor de petróleo e gás.
Ele diz que a empresa se associou a
executivos japoneses e que há surpresa quando eles se deparam com a burocracia
tributária brasileira.
DESBRAVAMENTO
Outra dificuldade é a
diferença de procedimentos que existe em cada legislação estadual. "A pessoa às
vezes nem consegue saber que precisa seguir determinadas normas, preencher
certos papéis", diz o advogado tributarista Antonio Carlos Rodrigues do Amaral.
O juiz do TIT (Tribunal de Impostos e Taxas) e sócio do escritório LBZ
Advocacia Raphael Garofalo elenca entre as peculiaridades estaduais (veja texto
abaixo) um selo de autenticidade que deve ser colado em todas as notas fiscais
que chegam ao Acre.
Já para a compra de uma mercadoria que vai do
Espírito Santo para São Paulo, é necessário que a nota fiscal tenha registrada a
placa do caminhão e o volume transportado, sob pena de multa.
Para
Amaral, "o emaranhado de normas é tão grande que o empreendedor brasileiro
precisa ter um espírito desbravador".
GUERRA FISCAL
Segundo o
advogado tributarista Fábio Soares de Melo, novas leis surgem em grande
quantidade devido a fatores como a necessidade do fisco de se adaptar a novos
negócios e melhorar a fiscalização e arrecadação.
Ele também atribui
parte da responsabilidade à "guerra fiscal" entre os Estados, ou seja, a ação
com objetivo de conseguir atrair investimentos de outras localidades concedendo
benefícios para determinadas operações.
Segundo ele, a complexidade e a
quantidade de alterações na lei geram um custo extra para as empresas, que
necessitam do auxílio de escritórios de contabilidade e consultorias fiscais e
jurídicas na apuração do imposto.
Apesar da burocracia, Soares de Melo
diz existir um ponto positivo no sistema, pois o empreendedor tem a
possibilidade de procurar um local que, dentro da legislação, ofereça vantagens
a ele.
Muitos desses incentivos, porém, são concedidos sem a autorização
do Confaz -órgão do Ministério da Fazenda integrado por representantes de todos
os Estados.
Edital para súmula vinculante no Supremo Tribunal Federal
pretende tornar inconstitucional todo incentivo dado sem autorização.
Também como forma de combater a guerra fiscal, o governo federal discute
com os Estados a redução da alíquota do ICMS nas transações interestaduais. A
ideia é ir dos atuais 12% e 7% para 4%.
A Folha procurou o Confaz, mas
não obteve resposta até o fechamento da edição.
Substituição tributária
gera controvérsias
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A substituição
tributária, em que uma parte fica responsável pelo recolhimento do ICMS de toda
a cadeia, é considerada pela consultora Flavia Martin o ponto mais complexo do
ICMS.
A ideia da substituição, segundo o advogado Antonio Carlos
Rodrigues do Amaral, é interessante no caso de itens em que existe uma alta
concentração na produção e dispersão na distribuição, como refrigerantes ou
cigarros.
No entanto, como antecipa o recebimento do imposto pelos
Estados e facilita a fiscalização, o sistema passou a ser utilizado para
qualquer tipo de produto indistintamente, diz o tributarista.
Além
disso, não há consenso entre Estados sobre todos os produtos que estão sujeitos
a esse regime de tributação. Nem sobre as margens de valor agregado (MVA),
estimativa do valor final do produto substituído sobre o qual se aplica a
alíquota.
Em transações interestaduais sujeitas à substituição, o
fornecedor é responsável por recolher o imposto e entregá-lo ao Estado de
destino da mercadoria.
Como nem sempre há consenso sobre o que deve ser
substituído, a consequência é o surgimento de "barreiras alfandegárias" entre
Estados, com o objetivo de garantir o recebimento antecipado do imposto.
"Estamos indo na contramão dos blocos desenvolvidos, que estão acabando
com as barreiras", diz Bruno Quick, gerente de políticas públicas do Sebrae.
PEQUENAS EMPRESAS
De acordo com Quick, a substituição
tributária, do modo como é tratada atualmente, é responsável por diminuir a
eficácia do Simples Nacional, regime de tributação simplificado para micro e
pequenas empresas que unifica impostos.
Se uma indústria optante do
Simples, por exemplo, produz um produto que tem ICMS pago por substituição
tributária, terá que pagar a alíquota do produto em separado e realizar uma
contabilidade paralela para este. Isso gera custos com os quais a pequena
empresa nem sempre consegue lidar.
A empresa também precisa recolher o
imposto antes de receber pelo produto, o que cria uma necessidade de capital de
giro que é crítica para os pequenos.
Quick também critica o fato de as
margens de valor agregado utilizadas prejudicarem a competitividade das pequenas
empresas, que, por não trabalhar em grande escala, precisam vender seus produtos
com uma margem de lucro maior do que a das grandes para sustentar seus negócios,
mas pagam o mesmo imposto.
FILIPE OLIVEIRA
COLABORAÇÃO PARA A
FOLHA